Tive a ousadia de refazer a capa do premiado romance de Jennifer Egan, "A Visita Cruel do Tempo". Este livro já foi resenhado nesse blog. Pra acessar a resenha é só clicar aqui.
Primeiramente o que me levou a refazer essa capa foi apenas um desafio que me fiz para tentar traduzir em imagens o que encontrei no romance. O livro recebeu muitas versões diferentes de capas em vários países e eu gostei praticamente de todas que vi. São leituras diferentes da mesma história e todas têm sua razão de existir. Minha capa é só uma versão não oficial de como seria a capa caso eu fosse o profissional responsável.
A capa da versão brasileira foi feita pelo cartunista Rafael Coutinho, e mostra uma imagem bem caótica do que parece ser um rosto desfigurado pela velhice. Os traços erráticos transmite uma sensação de confusão e fragmentação psicológica, o que casa bem com o romance.
Na capa original vemos uma abordagem mais minimalista. Uma mão de guitarra tipo pictograma no centro da capa. Na minha opinião essa versão não representa o que o livro oferece, pois é simplista demais.
Em uma versão posterior podemos ver uma sobreposição de imagens de pessoas em cores diversas no que parece a primeira vista uma briga. Isso mostra o aspecto fragmentado da obra que tem vários pontos de vista que se sobrepõem.
Na versão britânica temos uma mulher se protegendo de uma chuva de notas musicais com uma sombrinha. Talvez indicando o quanto a indústria musical manipula nossa existência, a ponto de termos que nos proteger.
A versão em espanhol da obra recebeu o singelo título de "El Tiempo es un Canalla", o que a meu ver, amplifica uma personificação do tempo como sendo uma figura insensível e implacável, além de ter um tom irônico, que está em total sintonia com a obra.
A capa da versão em espanhol optou por uma mensagem visual mais limpa e direta. Uma fita cassete, simbolizando o tempo pretérito da indústria fonográfica, que expele um emaranhado de fita simbolizando a estrutura caótica do livro. Achei interessante a ideia desse design.
A minha capa
Para produzir a minha versão da capa de "A Visita Cruel do Tempo" decidi que usaria a técnica de manipulação de imagens. Utilizei fotos de bancos de imagens para construir imageticamente dois personagens do livro. Uma dificuldade de se colocar um protagonista na capa desse livro é o fato de se tratar de um conjunto de contos em que cada momento de narração temos um personagem diferente fazendo o papel de protagonista.
No caso o que faz a obra ter uma coerência em sua totalidade são as reflexões geradas sobre o tempo. Por isso decidi que o tempo seria o protagonista de minha capa sendo simbolizado pela grande ampulheta no centro. O personagem retratado na parte superior da imagem seria um músico decadente de um estilo que foi que foi essencial para construir a cara da cultura urbana na Nova Iorque da década de 1970. Nessa época o Punk Rock dominava o discurso rebelde entre os jovens nova iorquinos.
O livro fala disso ao retratar um figurão da indústria musical que foi um desses jovens punks lutando por um lugar ao sol naquele período. No momento atual ele busca revelar o música que o deixara mais rico. O personagem da parte inferior da ampulheta mostra um personagem genérico, talvez um músico - podemos ver um violão ao fundo. Esse sujeito está deitado em um sofá hipnotizado pela tela de seu celular. Essa questão do celular é importante para o romance, pois a autora se aventura a se embrenhar por um futuro próximo algum ano da década que vivemos hoje. É importante frisar que o livro foi publicado em 2010.
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André Stanley é historiador, professor de Inglês, espanhol e português para estrangeiros. Autor do livro "O Cadáver", editor do Blog do André Stanley. Possui um canal no Youtube onde fala de literatura, design e outros temas. Colaborador do site Whiplash, especializado em Heavy Metal. Foi um dos membros fundadores da banda de Heavy Metal mineira Seven Keys. Também é fotógrafo e artista digital.
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